Anotações acerca da Taittiriya Upanishad

Anotações de leitura da Taittirīya Upaniṣad



O texto abaixo são meras notas de aula, de modo que sua compreensão plena pressupõe o encontro  presencial. Haja vista que a disponibilização de traduções de qualidade em português ainda é um desideratum, acreditamos que a divulgação desse material possa ser útil aos participantes do curso Religiões e Filosofias da Índia.

O desenvolvimento do tema por escrito fica para uma próxima oportunidade.


A versão para impressão pode ser acessada aqui.

Questões introdutórias

  • O texto é pertencente ao Yajur Veda Saṁhitā, ou seja, faz parte do cânon revelado da religião védico/bramânica. Isso o diferencia de outras categorias de textos, como os textos filosóficos (sutra), épicos, purāṅas, etc.
  • Sendo um texto védico, faz parte da Śruti e não possui autoria (apauruṣaya).
  • O texto védico é dividido em karma kanḍa (textos ritualísticos) e jñana kanda (textos filosóficos), sendo a Upanixade referente a essa segunda categoria.
  • Estruturalmente, essa upanixade é dividida em 3 capítulos, chamados Valli.
  • Os parágrafos, como de hábito no contexto védico, apresentam métrica e características de estilo que desaparecem na tradução;
  • As traduções também tendem a dificultar a identificação do uso de termos especializados, conceituais.

1o. Valli


  • O 1o. Anuvāka do 1o. Valli é um verso introdutório que solicita a benção de divindades, algo muito usual na literatura sânscrita, mesmo a não religiosa. No caso presente, é interessante notar a pluralidade de referências, como a citação a Mitra e Aryaman, que remetem ao circuito mais amplo de trocas que abarcava da India ao Oriente Médio e mesmo o mundo Romano.
  • O tema do 1o. Valli é o Śīkṣa (pronúncia ou fonética), uma das seis disciplinas auxiliares dos Vedas, ou Vedāṅga. Por esse motivo, o capítulo é chamado Śīkṣa Valli.
  • As partes da Śīkṣa, que são apenas enumeradas, mas não desenvolvidas em exaustividade pelo texto, são:
    • ponto de inflexão/consoantes (varga)
    • vogais (svaraḥ)
    • métrica (mātrā)
    • ênfase, intensidade (balaṁ)
    • constância/regularidade (sāmaḥ)
    • pronúncia/sandhi (santānaḥ)
  • Segundo a ortodoxia védica, a eficácia mágico-religiosa do mantra está ligada à sua correta pronúncia. No caso de pronúncia errada, os efeitos serão distintos do almejado.



  • Após a enumeração dessas categorias do Shiksha, passa-se à explicação do Conhecimento Sagrado das Cinco Grandes Conjunções (“saṁhitāyāḥ upaniṣadam panccasu adhikaraneṣu vyakhyasyamaḥ”). É interessante sublinhar que “samhitā” possui vários sentidos, podendo designar “sentenças” de um texto. Assim sendo, as “coleções” a seguir também podem ser lidas como níveis de sentido do texto védico. Elas são:
    • mundos
    • luzes
    • conhecimento
    • progênie
    • si-mesmo ou alma
  • para cada uma dessas conjunções/coleções é dada uma forma inicial (pūrvarupaṁ); forma final (uttararūpaṁ); um ponto de junção (sandhiḥ) e um meio (maedium) de junção (sandhānaṁ  ). A forma anterior e a forma posterior são como as letras que se encontram no fenômeno gramatical do sandhi. (como a + u = o)


  • Mundos
    • Terra
    • Céu
    • Espaço atmosférico
    • Ar (vayu)  


  • Luzes
    • Fogo
    • Sol
    • Água
    • Relâmpago (compreensão?)

  • Conhecimento
    • Professor
    • Aluno
    • Conhecimento
    • Ensino/recitação

  • Progênie
    • mãe
    • pai
    • filho
    • procriação

  • Si
    • lábio inferior
    • lábio superior
    • linguagem (vāk).
    • língua


Após algumas bendições, no quinto capítulo a Upanixade inicia mais quatro séries, que compara a Bhū, Bhuva, Svaha. Além dos três, há um quarto, que é o Grande (Maha),, que é o Braḥman.  Os deuses são como seus membros (de seu corpo).
Note-se que Om é shabda braḥman (palavra-braḥman) e origem de todos os sons. O sol é a origem dos Três Mundos (bhū, bhuva, svaha)

  • Esse mundo
  • Céu
  • Aquele mundo
  • Sol (maha)

  • Fogo (fogo sacrifical, como o “sol na terra”)
  • Ar (vayu. Pode remeter à noção de prāṅa)
  • Sol
  • Lua “que faz aumentar a luz de todos os luminares” (Chandra = remete ao Soma)


  • Rik
  • Samas
  • Yajus
  • Braḥman (maha)/ Om

  • Prāṅa  (“inspiração”, “absorção”)
  • Apāṅa (“expiração”, “excreção”)
  • Vyāṅa (“circulação” do ar)
  • Anna (alimento). Pelo alimento, todos os pranas são nutridos.

Note-se que essas séries encerram, em suas categorias: a estrutura ou fundamento do cosmos; do ritual; dos vedas; do microcosmo (eu). É como se cada uma dessas totalidades fosse uma totalidade orgânica. Interessante notar o paralelismo entre as afirmações dessa upanixade de que os deuses são como membros de um corpo que é Brahman, enquanto na Katha vimos que os devas habitam o corpo, como num círculo ao redor do hiranyagarbha (embrião, semente, ovo cósmico), no coração do homem.

“Quem conhece essas quatro quatríades conhece o Braḥman. Para ele os deuses oferecem sacrifícios”.

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